terça-feira, 1 de dezembro de 2009

A Terceira Porta da Liberação


A Terceira Porta da Liberação é a ausência de objetivo. Não há nada a fazer, nada a realizar, nenhum programa a ser cumprido, nenhuma agenda. Esse é o ensinamento budista sobre os fins últimos do homem. A rosa tem que fazer alguma coisa? Não, o objetivo da rosa é apenas ser uma rosa. Seu objetivo é ser quem você é. Você não precisa sair correndo e se tornar outra pessoa. Você é maravilhoso do jeito que é. Esse ensinamento do Buda permite que a gente se divirta, contemple o céu azul e tudo o mais que é tão bom e refrescante no momento presente.

Não há nenhuma necessidade de inventar objetivos para depois correr atrás deles. Nós já temos tudo o que é necessário, já somos aquilo em que desejamos nos tornar. Somos todos Budas, por isso podemos dar a mão a um outro Buda e praticar a meditação andando. Esse é o ensinamento do Avatamsaka Sutra. Seja você mesmo, a vida é preciosa do jeito que é. Não há necessidade de correr, lutar, carregar fardos nem disputar coisas. Podemos apenas existir. Estar aqui, neste momento, neste lugar, já é uma forma profunda de meditação. A maioria das pessoas não acredita que caminhar sem pressa e despreocupadamente seja o bastante. As pessoas acham que lutar e competir são coisas normais e necessárias. Tente praticar a ausência de objetivos por cinco minutos apenas, e observe como será feliz durante esses cinco minutos.

O Sutra do Coração diz que não há nada para ser atingido. Nós não meditamos para atingir a iluminação, porque a iluminação já está em nós, conseqüentemente não há necessidade de busca-Ia. Não precisamos de propósitos nem de metas. Nossa prática não visa obter uma alta posição. Quando praticamos a ausência de objetivo, entendemos que nada nos falta, que já somos tudo o que queríamos ser. Nessa altura, nossa luta desesperada principia a cessar. Fazemos as pazes com o momento presente, e conseguimos observar a luz do sol entrando pela janela e ouvir o barulho da chuva. Não precisamos mais correr atrás de coisas externas. Podemos usufruir esse momento. As pessoas discutem como chegar ao Nirvana, mas na verdade já estamos lá. A ausência de objetivo e o Nirvana são uma coisa só.

Ao acordar hoje de manhã eu sorri.
Vinte e quatro horas, novinhas em folha, ao meu dispor.
Tenho a firme intenção de viver plenamente cada momento do meu dia,
E olhar para todos os seres com o olhar da compaixão.

Essas vinte e quatro horas são uma dádiva preciosa, que só poderemos usufruir completamente quando tivermos aberto a Terceira Porta da Liberação, que é a ausência de objetivo. Se pensarmos que temos vinte e quatro horas para realizar alguma coisa, o dia de hoje passa a ser um meio para atingir um fim. O momento de cortar madeira ou carregar água é o momento que temos para sermos felizes. Não devemos esperar que essas tarefas estejam terminadas para só então sermos felizes. Ser feliz agora significa não ter metas agora. Se não fizermos isto, andaremos em círculo pelo resto da vida. No momento presente, temos tudo o que necessitamos para fazer desse momento o mais feliz de nossas vidas, mesmo se estivermos com dor de cabeça ou com um resfriado. Não temos que esperar o resfriado acabar para poder ser felizes. Resfriar-se é parte da vida.

Alguém me perguntou: "Você não está preocupado com a situação do mundo?" Eu respirei e respondi: "O mais importante é não permitir que a ansiedade em relação aos acontecimentos mundiais encha o seu coração. Se o coração for preenchido pela ansiedade, você ficará doente, e não poderá ajudar quando for necessário." Existem guerras - grandes e pequenas - em muitos lugares, e isso pode nos tornar ansiosos. A ansiedade é a doença de nosso tempo. Estamos sempre preocupados conosco, com a família, com os amigos, com o trabalho, e também com a situação do mundo. Se permitirmos que a preocupação inunde os nossos corações, mais cedo ou mais tarde ficaremos doentes.

É verdade que existe uma enorme quantidade de sofrimento por este mundo afora, mas o fato de saber disso não significa que estamos paralisados. Se praticarmos a respiração, a caminhada, a meditação e o trabalho com consciência, e fizermos o melhor que pudermos para ajudar os outros, teremos paz no coração. A preocupação não realiza nada. Mesmo se nos preocuparmos dez vezes mais, isso não melhorará em nada a situação do mundo. Na verdade, a ansiedade só faz piorar as coisas. Mesmo sabendo que nada é como gostaríamos que fosse, devemos ficar contentes mesmo assim, porque estamos dando o nosso melhor, e continuaremos a fazer isso. Se não soubermos respirar, sorrir e viver com atenção e profundidade cada momento de nossa vida, nunca poderemos ajudar ninguém. Sou feliz agora. Não me falta nada. Não espero nenhum tipo de felicidade adicional nem condições ideais para poder ser mais feliz ainda. A prática mais importante de todas é ausência de objetivo, em vez de ficar correndo atrás das coisas intensamente.

Aqueles dentre nós que tiveram a sorte de conhecer e praticar a atenção plena têm a responsabilidade de trazer paz e alegria para as suas vidas, mesmo que as condições do corpo, da mente ou do meio ambiente não sejam exatamente as que gostaríamos. Sem felicidade não poderemos ser um refúgio para os outros. Pergunte a si mesmo. O que estou esperando para ser feliz? Por que não fico feliz agora mesmo? Meu único desejo é ajudar vocês todos a entenderem isso. Como podemos inserir a prática da atenção plena na sociedade? Como podemos ajudar o maior número possível de pessoas a ser feliz e a ensinar a arte da atenção plena a outras pessoas? O número de pessoas capazes de gerar violência é muito grande, enquanto que um número muito reduzido sabe respirar e gerar felicidade. Todo novo dia representa mais uma oportunidade para ser feliz e ser um refúgio para os outros.

Não precisamos nos tornar nada além do que já somos. Não precisamos desempenhar nenhuma ação específica. Só precisamos ser felizes no momento presente, e dessa forma estaremos sendo úteis às pessoas que amamos e a toda a sociedade. A ausência de objetivo significa parar e entender que a felicidade está ao nosso alcance. Se for perguntado quanto tempo alguém precisa praticar para ser feliz, eu responderei que essa pessoa pode ser feliz imediatamente. A prática da ausência de objetivo é a prática da liberdade.

(Do livro “A Essência dos ensinamentos de Buda” – Thich Nhat Hanh)

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

A Segunda Porta da Liberação




A Segunda Porta da Liberação é a ausência de imagens. Neste contexto, "imagem" quer dizer uma aparência, ou um objeto de percepção. Quando vemos algo, é porque um sinal ou imagem aparece diante de nós, e é isso que chamamos de lakshana. Se a água, por exemplo, estiver em um recipiente quadrado, sua imagem é a "quadratura" do recipiente. Se estiver em um recipiente redondo, será a "redondeza". Quando abrimos o congelador e tiramos gelo, a imagem recebida é de que a água está sólida. Os químicos chamam a água de "H2O". A neve nas montanhas e o vapor que se eleva da chaleira também são H2O. Se H2O estiver no momento redonda ou quadrada, líquida, gasosa ou sólida, dependerá das circunstâncias. As imagens são instrumentos para nosso uso, mas não são a verdade absoluta. Elas podem nos enganar. O Sutra do Diamante diz: "Onde houver uma imagem, haverá uma ilusão”. As percepções costumam nos dizer tanto sobre quem percebe quanto sobre o objeto percebido. As aparências enganam.

A prática da Concentração na Ausência de Imagens é necessária para que possamos nos libertar. Sem enxergar além das imagens não atingiremos a realidade propriamente dita. Enquanto ficarmos presos às imagens - redondo, quadrado, sólido, líquido, gasoso - continuaremos a sofrer. Nada pode ser descrito em termos de uma imagem apenas. Mas sem imagens nós ficamos ansiosos. Nosso medo e nosso apego se devem a ficarmos presos a imagens. Até entendermos que todas as coisas têm uma natureza desprovida de imagens, continuaremos com medo e sofrendo. Para poder entrar em contato com a H2O, temos que esquecer de imagens tais como quadrado ou redondo, duro ou mole, pesado ou leve, em cima ou embaixo. A água, por si mesma, não é nenhuma dessas coisas. Só quando conseguirmos nos libertar das imagens estaremos aptos a penetrar no âmago da realidade. Enquanto não conseguirmos enxergar o oceano nos céus, continuaremos iludidos pelas imagens.

Um grande alívio advém quando rompemos as barreiras das imagens e atingimos o mundo que está além das imagens, o Nirvana. E onde devemos procurar este mundo sem imagens? Aqui mesmo, no meio do mundo das imagens. Se jogarmos a água fora, não haverá nenhuma forma de ter contato com a essência da água. Contatamos sua essência quando abrimos caminho através das imagens e chegamos à verdadeira natureza da interdependência dos seres. As três fases são a água, a não-água e a verdadeira água. A verdadeira água é a essência da água. O fundamento de sua existência não está sujeito ao nascimento nem à morte. Quando chegarmos a isso, não teremos mais medo de nada.

"Quando chegarmos à ausência das imagens dentro das imagens, encontraremos o Tathagata. Esta é uma frase do Sutra do Diamante. Tathagata significa "a natureza maravilhosa da realidade". Para ver a natureza maravilhosa da água é preciso olhar além das imagens (aparências) da água, e ver que ela é constituída de elementos não-água. Se você achar que a água é apenas água, que não pode ser o sol, a terra ou as flores, estará enganado. Terminará por entender que a água na verdade é o sol, a terra e as flores, e que apenas ao olhar para o sol, a terra e as flores você estará vendo a água. Isto é a "ausência de imagens das imagens". Um jardineiro orgânico que olha para uma casca de banana, folhas moitas ou galhos podres enxerga as flores, frutas e os legumes contidos neles. Ele saberia que as flores, as frutas e o lixo não têm existência independente. Ao aplicar esta compreensão a outras áreas de sua vida, o jardineiro pode atingir o despertar total. (...)

A ausência de imagens não é uma idéia apenas. Ao contemplar nossos filhos, vemos os elementos que os produziram. Eles são como são porque nossa cultura, economia, sociedade e nós mesmos somos do jeito que somos. Não podemos simplesmente culpar nossos filhos quando as coisas dão errado. Muitas causas e condições contribuíram. Quando soubermos transformar a nós mesmos e a sociedade, nossos filhos também se transformarão. Os jovens aprendem a escrever e ler, aprendem matemática, ciências, e outras matérias na escola para ajudá-los a ganhar a vida. Mas poucos currículos escolares ensinam os jovens a viver - como lidar com a raiva, como reconciliar os conflitos, como respirar, sorrir, como transformar as formações interiores. A educação necessita de uma revolução. Precisamos incentivar as escolas a ensinar a seus alunos a arte de viver em paz e harmonia. Não é fácil aprender a ler, escrever, ou resolver problemas matemáticos, mas as crianças conseguem. Aprender a respirar, sorrir e transformar a raiva também pode ser difícil, mas já vi muitos jovens conseguirem. Se ensinarmos às crianças valores adequados, quando elas tiverem apenas doze anos já saberão viver em harmonia com as outras pessoas.

Quando vamos além das imagens, entramos em um mundo onde não há medo nem culpa. Vemos a flor, a água e o nosso filho por um prisma que está além do tempo e do espaço. Sabemos que nossos ancestrais estão presentes dentro de nós, aqui e agora. Constatamos que Buda, Jesus, e todos os outros ancestrais espirituais não morreram. O Buda não pode ficar confinado há 2.600 anos. A flor não está limitada à sua breve manifestação. Tudo se manifesta por meio de imagem. Se ficarmos presos às imagens, sempre teremos medo de perder as manifestações específicas.

Quando um menino de oito anos que vivia em Plum Village morreu de repente, pedi a seu pai que mantivesse a plena consciência da presença do filho no ar que respirava e nas folhas de grama sob seus pés, e ele conseguiu fazer isso. Quando um conhecido professor de meditação vietnamita morreu, seu discípulo escreveu o seguinte poema:

Irmãos de Darma, não se apeguem às imagens.
As montanhas e os rios que nos cercam são nossos professores.

O Sutra do Diamante enumera quatro imagens - o eu, a pessoa, o ser vivo e o período de vida. Ficamos enredados na imagem eu, porque achamos que existem inúmeras coisas que não são eu. Mas quando contemplamos a questão com profundidade, vemos que não existe um eu separado e independente, o que nos liberta da imagem do eu. Entendemos então que para nos protegermos temos que proteger tudo o que não é nós mesmos.

Também ficamos enredados na imagem "pessoa". Separamos os seres humanos dos animais, árvores e pedras, e achamos que os não-humanos - peixes, vacas, plantas, terra, ar e mar - estão lá apenas para serem explorados por nós. As outras espécies também caçam para comer, mas não de uma forma exploratória como nós. Quando olhamos para a nossa espécie, vemos os elementos não-humanos contidos nela, e quando olhamos para os reinos animal, vegetal e mineral, vemos o elemento humano neles. Quando praticamos a Concentração na Ausência de Imagens, sabemos viver em harmonia com todas as espécies.

A terceira imagem é "ser vivo". Achamos que seres conscientes são diferentes de não-conscientes. Mas seres vivos ou sensíveis são feitos de espécies não-vivas ou não-sensíveis. Quando poluímos as espécies chamadas de não-vivas, como o ar ou os rios, estamos poluindo os seres vivos também. Se pensarmos na interdependência dos seres vivos e não-vivos imediatamente pararemos de agir deste modo.

A quarta imagem é "período de vida", que é o período de tempo entre o nascimento e a morte. Nós achamos que só estamos vivos por um período específico de tempo, que teve um começo e terá um fim. Mas ao contemplar profundamente, constatamos que nunca nascemos e nunca morreremos, e nosso medo se dissolve. Com atenção plena, concentração e as Três Qualidades do Darma, podemos abrir a Porta da Liberação que é a ausência de imagens e conquista o maior de todos os alívios.




(Do livro “A Essência dos ensinamentos de Buda” – Thich Nhat Hanh)

terça-feira, 24 de novembro de 2009

As Três Portas da Liberação


As Três Qualidades do Darma são as chaves de que dispomos para abrir as Três Portas da Liberação - o vazio, a ausência de imagens e a ausência de objetivo. Todas as escolas de budismo aceitam o ensinamento das Três Portas da Liberação. Essas três portas às vezes são chamadas de Três Concentrações. Quando passamos por essas portas, adquirimos concentração e nos libertamos do medo, da confusão e da tristeza.

A Primeira Porta da Liberação é o vazio. O vazio sempre significa vazio de alguma coisa. O copo está vazio de água, e a tigela vazia de sopa. Nós estamos vazios de um eu independente e separado. Não podemos existir sozinhos. Só podemos existir em inter-relação com tudo o mais que existe no cosmos. A prática consiste em incentivar a compreensão do vazio durante todo o tempo. Aonde quer que vamos, entramos em contato com o vazio que existe em tudo. Olhamos para a mesa, o céu azul, o nosso amigo, a montanha, o rio, a raiva e a felicidade, entendendo que tudo isso está vazio de um eu independente e separado. Quando contemplamos essas coisas em profundidade, vemos a natureza interpenetrante e interdependente de tudo o que existe. O vazio não significa, em absoluto, não-existência. Significa Origem Interdependente, Impermanência e Não-eu.

Quando ouvimos falar de vazio, ficamos assustados. Mas depois de praticar por algum tempo, entendemos que as coisas realmente existem, só que de forma diferente do que pensávamos. O vazio é o Caminho do Meio entre a existência e a não-existência. A flor não se toma vazia quando murcha e morre, mas sempre foi vazia em sua essência. Ao olharmos em profundidade, vemos que a flor é composta de elementos não-flor - luz, espaço, nuvens, terra e consciência. Está vazia de um eu independente e separado. No Sutra do Diamante, aprendemos que um ser humano não é independente das outras espécies, e que para proteger os seres humanos é preciso proteger as espécies não-humanas. Se poluirmos o ar, a água, os vegetais e os minerais, estaremos destruindo nós mesmos. Temos que aprender a nos enxergar de outra maneira, vendo a nós mesmos naquelas coisas que sempre pensamos que estivessem fora de nós, e dissolvendo nossas falsas fronteiras.

No Vietnã, dizemos que se um cavalo estiver doente, todos os outros cavalos do estábulo recusam comida. Nossa felicidade e sofrimento são a felicidade e o sofrimento de todos. Quando agimos baseados no não-eu, nossa ações passam a estar em consonância com a realidade, e sabemos o que devemos fazer e não fazer. Quando temos consciência de que estamos todos ligados uns aos outros, adquirimos a Consciência do Vazio. A realidade está muito além de nossas idéias sobre ser e não ser. Dizer que uma flor existe não é exatamente correto, mas dizer que ela não existe também não é verdadeiro. O verdadeiro vazio é chamado de "ser maravilhoso", porque está além da existência e da não-existência.

Quando comemos, devemos praticar a Porta da Liberação chamada de vazio. "Eu sou este alimento. Este alimento sou eu." Um dia, no Canadá, quando eu almoçava com a Sangha, um estudante me olhou e disse: "Estou alimentando você." Ele estava praticando a concentração no vazio. Cada vez que olhamos nosso prato de comida, podemos contemplar a natureza impermanente da comida. Esta é uma prática profunda, porque tem o poder de nos ajudar a enxergar a "Origem Interdependente". Aquele que come e a comida ingerida são, por natureza, vazios. É por isso que a comunicação entre eles é perfeita. Quando praticamos a meditação andando de uma forma relaxada e pacífica, acontece a mesma coisa. Cada passo que damos não é dado apenas para nós, mas para o mundo. Quando olhamos para os outros, vemos sua felicidade e sofrimento ligados a nossa felicidade e sofrimento. "A paz começa em mim mesmo."

Todos aqueles que amamos um dia ficarão doentes e morrerão. Sem praticar a meditação no vazio, quando isto acontecer ficaremos arrasados. A Concentração no Vazio é uma forma de permanecer em contato com a vida como ela é, mas precisa ser praticada, e não apenas falada. Observamos nosso corpo e vemos as causas e condições que o fizeram existir - nossos pais, nosso país, o ar, e até mesmo as gerações futuras. Vamos além do tempo e do espaço, do eu e do meu, e experimentamos a verdadeira libertação. Se só estudarmos o vazio como uma filosofia, ele não será para nós uma Porta da Liberação. O vazio só se torna uma Porta da Liberação quando penetramos nele com profundidade, entendendo a natureza interdependente e o aparecimento conjunto de tudo o que existe.


(Do livro “A Essência dos ensinamentos de Buda” – Thich Nhat Hanh)

sábado, 14 de novembro de 2009

Palavras de Sabedoria


Quando tudo muda, misteriosamente nossa natureza não muda!

Onde está ela? Como ela se manifesta?

Eis um bom momento para vê-la ativa como sempre criando as novas relações e as novas identidades. Vê-la com sua luminosidade produzindo os significados e costurando teias que antes não existiam e são apenas teias leves, luminosas, etéreas por mais densas que queiramos que pareçam.
A densidade é apenas aparente enquanto a responsividade é intensa. É um bom momento de usar a mente agitada, que não dorme direito, que produz a aparência de muitos diferentes cenários, pessoas e paisagens para contemplar a luminosidade intensa que se oferece como imagens presentes mesmo quando os olhos fecham.

Para os bons praticantes os bons momentos e os momentos de aflição não se distinguem pois são momentos sempre especiais.
Tenta que a luminosidade crie valores e não sofrimentos.

Tenta que a luminosidade transforme as relações e situações antigas em algo produtivo e benigno a todos.

Tenta não defender identidades e nem justificá-las mas manter sempre vivo a natureza que está além delas, impermanentes e flutuantes que são.

Tenta não culpar as identidades pois elas sempre produzem dificuldades, inevitavelmente, assim não há porque se surpreender ou ficar preso a culpas e avaliações.

Todas identidades produzem dificuldades.

Lama Padma Samten.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Vipassana nas prisões

Queridos amigos,

Este vídeo legendado é o primeiro, de 5 outros vídeos, que fazem parte de um importante documentário. Nele vocês terão a oportunidade de apreciar uma rica experiência transformadora nas prisões da India. Uma verdadeira prova do poder transformador da meditação.
Aos que puderem assistir, recomendo.

Amor e paz!!!!


domingo, 8 de novembro de 2009






"TAL COMO O ARQUEIRO APONTA A FLECHA OU

O CARPINTEIRO ESCULPE A MADEIRA, O SÁBIO

MOLDA A SUA VIDA"



Dhammapada

domingo, 1 de novembro de 2009

UM LAMA QUE FALA A LÍNGUA DA GENTE


REVISTA MUITO - GRUPO A TARDE

Publicada por Tatiana Mendonça, em 31 out 09.


Padma Samten, primeiro lama brasileiro, ordenado há 12 anos por seu mestre, Chagdud Tulku Rinpoche, pertence à linhagem Ningmapa e à família Padma, que dentro do budismo está vinculada a um dos mais nobres valores: a compaixão. Este é um dos principais ensinamentos de Tenzin Gyatso, Sua Santidade o 14º Dalai Lama. É o tema de quase todos os seus livros e do discurso em Oslo, ao ganhar o Prêmio Nobel da Paz de 1989. É o que representa ao vestir a thuba vermelho ruby, cor que no budismo simboliza a compaixão.


O Lama Padma Samten, veste a mesma cor. “Sua Santidade o Dalai Lama é um dos meus mestres. Eu olho para ele e vou me movendo não só de modo inspirado por ele, mas também tentando repercutir o que ele faz, portanto, ajudar para que aquilo cresça ainda mais. Acho que ele está tendo essa clareza, para saber o que é necessário fazer para salvar nossa cultura, salvar o planeta, reduzir o sofrimento dos seres”, diz o lama brasileiro, se detendo em explicar que o Budismo está baseado em três orientações: “Não crie sofrimento para os seres, dê benefício para os seres e dirija sua própria mente”.


Nascido Alfredo Aveline há 60 anos, em Porto Alegre, mestre em física quântica e ex-professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Padma Samten vem se tornando conhecido no País pela coerência de seu discurso e pela atuação vigorosa à frente do Centro de Estudos Budistas Bodisatva (CEBB). Com sede em Viamão (RS), o centro se faz representar em 30 cidades no Brasil, Uruguai e Canadá, por atividades muitas vezes dirigidas pelo próprio lama, que cumpre uma agenda cheia, ano após ano.


O trabalho vem dando frutos. Há poucos meses recebeu um convite da Rede Globo e Canal Futura para participar do programa Sagrado, que reúne líderes de diferentes correntes religiosas. O programa, que no canal aberto vai ao ar diariamente às 6h05, e aos domingos às 6h50, sinaliza para a popularidade do budismo no Brasil. “Você acha?”, pergunta animado.


Para o lama, o segredo do sucesso é simples: a adequação dos ensinamentos aos temas cotidianos. Em suas palestras ele fala que cada um deveria analisar suas próprias ações, perguntando a si mesmo: “O que posso fazer para não ferir as outras pessoas? O que posso fazer de bom para as outras pessoas?”. Simples assim.


Esta é a fórmula miraculosa também de Sua Santidade, o Dalai Lama, um comunicador nato que faz esta conexão entre os ensinamentos do Buda e o cotidiano de gente comum, que nem tem religião ou tem pouco acesso ao conhecimento. Ele vem fazendo isso através de seus livros, no Brasil publicados por várias editoras. Para Padma Samten, o Dalai Lama vem contribuindo para popularização do budismo no mundo.“Sua Santidade o Dalai Lama é o Prêmio Nobel da Paz. Ele exeuta muito bem a sua função. Está construindo uma cultura de paz. Ele está criando pontes entre as culturas, linguagens que nos permitem aproveitar o melhor de cada cultura – e não só da tradição budista, das várias tradições religiosas. Ele tem essa postura maravilhosa”.Para Padma Samten, o budismo tem respostas para as questões cruciais da humanidade. Ele mesmo encontrou, na senda do Buda, a ressonância para suas inquietações como ser humano, como físico e ativista ambiental, que no passado havia lutado contra a instalação de energia nuclear no Brasil. “No budismo é assim: nós trabahamos para que as nossas ações sejam as mais perfeitas agora, de tal modo que repercutam de forma positiva e de forma ampla”, esclarece. Para ele, esta visão explica por si mesma o poder da compaixão.


Fonte: REVISTA MUITO - Revista Semal do Grupo A Tarde - Salvador/Ba

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Canal do Lama Samten no youtube

Queridos,

Agora o Lama Samten tem um canal no youtube com todos os seus vídeos que circulam pela internet. Você poderá encontrá-los de forma organizada. Que todos possam se beneficiar com estes ricos ensinamentos.

O endereço é: http://www.youtube.com/lamapadmasamten

Carinho,

Padma Jigme

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Palavras do Meu Professor Perfeito


Quando você não tiver obsessões,

quando você não tiver pendências,

quando você não tiver inibições,

quando você não estiver com medo,você vai infringir algumas regras.


Quando você não tiver medo,você não vai se preocupar em satisfazer as expectativas de ninguém.

Que outra iluminação você quer?É isso!


(Dzongsar Khyentse Rinpoche - extraído do documentário "Palavras do Meu Professor Perfeito")

sábado, 24 de outubro de 2009

TRAVESSIA



"Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já têm a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia e se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos."


Fernando Pessoa

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Eu e outros

Como você deseja ser feliz, então você deve desejar que os outros sejam felizes também. Como você deseja estar livre do sofrimento, então você deve desejar que todos os seres possam também ser livres do sofrimento. Você deve pensar, "Possam todos os seres sencientes encontrar felicidade e a causa da felicidade. Possam ser livres do sofrimento e da causa do sofrimento. Possam sempre ter felicidade perfeita, livre do sofrimento. Possam viver em equanimidade, sem apego ou aversão, mas sim com amor diante de todos, sem qualquer discriminação."
Sentir amor transbordante e compaixão quase insuportável por todos os seres sencientes é o melhor modo de realizar os desejos de todos os buddhas e bodhisattvas. Mesmo se no momento você não puder efetivamente ajudar ninguém de forma externa, medite constantemente sobre o amor e a compaixão durante meses e anos, até que a compaixão esteja inseparavelmente entrelaçada no próprio tecido de sua mente.
Conforme você tenta praticar e progredir no caminho, é essencial lembrar que seus esforços são para o benefício dos outros. Seja humilde e lembre que todos os seus esforços são como uma brincadeira de criança se comparadas à vasta e infinita atividade dos bodhisattvas. Assim como pais dando provisões aos filhos que amam tanto, nunca pense que você fez muito para os outros, ou que já basta. Mesmo se finalmente planejar estabelecer todas as criaturas vivas no estado búddhico perfeito, simplesmente pense que todos os seus desejos foram realizados. Nunca deve haver nem mesmo um rastro de esperança por qualquer benefício para si mesmo em retorno.
A essência da prática do bodhisattva é ir além do autoapego e se dedicar a servir os outros. A atividade do bodhisattva depende da mente, não de como suas ações possam parecer externamente. A verdadeira generosidade é a ausência de apego, a disciplina última é a ausência de desejo e a paciência autêntica é a ausência de raiva. Os bodhisattvas são capazes de dar seu reino, seu corpo, suas posses mais caras, porque superaram completamente qualquer tipo de pobreza interior e estão incondicionadamente prontos para preencher as necessidades dos outros.

Dilgo Khyentse Tashi Paljor

domingo, 11 de outubro de 2009

O Caminho de contemplação e meditação

Há várias maneiras de penetrar no Darma. Este processo que descrevemos agora é o que começa com a própria meditação. Ele pertence ao Mahayana, é um método que combina estudo, instrução e meditação, está baseado nos sutras. Não há nenhuma prática de visualização, recitação de mantras, etc. - pelo contrário, é um processo analítico que utiliza a meditação como instrumento. Utilizamos de ponta a ponta todos os processos cognitivos - nenhuma prática ligada a qualquer yidam ou preces, sadhanas, enfim, nenhum elemento do Vajrayana. Não utilizamos nenhum elemento construído, é um processo que busca diretamente lucidez sem nenhum elemento intermediário que não a cognição e serenidade.
No Vajrayana criamos para depois dissolver, aqui não há visualização de qualquer yidam, ou terra pura, apenas o nobre e sereno sentar. Através do efeito combinado da meditação silenciosa e do processo analítico, removemos todos os elementos até reconhecermos o aspecto incessante da natureza não-construída.
É um processo de purificação gradual: pela lucidez removemos progressivamente nossa fixação ao que foi construído. Em nenhum momento é necessário ter fé ou qualquer outra crença. Não é um processo intelectual, no qual geramos uma teoria. Também não privilegiamos nenhum estado mental especial, seja ele instrumento do caminho ou não, e progressivamente ultrapassamos os diversos estados mentais, produtos de nosso próprio carma eliminando a fixação. É o caminho de dissolução das fixações ao que é virtual.
Não consideramos nenhum elemento puro ou impuro, esta análise não pertence ao processo, mas reconhecemos incessantemente liberdades que não víamos antes. A palavra essencial é liberdade. Olhamos os processos mentais e emocionais não no sentido de localizar o que é bom ou ruim, mas no sentido de eliminarmos as marcas que produzem limitação em nossa liberdade. Quando removemos os obstáculos a visão se amplia, é apenas isto. Não é que existam elementos bons e ruins de fato. A visão Hinayana funciona de outro modo, o bom e o ruim é que legitimam uma visão de mundo. Porém, na visão Mahayana não temos panoramas que possam fixar visões finais e elementos positivos e negativos. A visão que temos do mundo está determinada por fatores sutis e estes fatores é que de fato nos aprisionam. Focamos, então, diretamente o que aprisiona, não os elementos bons e ruins criados pela visão condicionada operando desde estes fatores sutis.
Quando olhamos um filme, há coisas boas e ruins, mocinhos e bandidos, e nos aliamos automaticamente aos elementos que nos são simpáticos. De dentro do contexto do filme dizemos: "é mais adequado me conectar aos personagens positivos", não quero ligar-me aos assassinos, ladrões, estupradores, etc. Como iríamos nos ligar a eles? Assim é a visão Hinayana, operando segundo este enfoque, a mente raciocina segundo o roteiro do filme, aceita a estória e tenta seguir os valores positivos. Na visão Mahayana percebemos que há uma tela e uma luz que é projetada, então podemos nos livrar do próprio contexto proposto pelo roteiro do filme, reconhecemos que há um roteiro e como a experiência de realidade é criada e passa a dominar nossas emoções e dirigir nossa mente. Vemos que nossa identidade está claramente além daqueles personagens.
Na nossa vida cotidiana é o mesmo. As experiências também obedecem fatores sutis que não reconhecemos. Devido a isto, por vidas infindáveis operamos dentro daqueles padrões submetidos a experiências específicas de mundos "virtuais" particulares. A liberação não é estar num lugar seguro dentro do filme, um lugar limpo e bom, mas ver que o processo do filme é construído, é virtual, não é sólido, e, especialmente, que carrega em si liberdades reais, ainda que ocultas e insuspeitadas aos que se fixam na estória. As liberdades são o foco.
Mais adiante desenvolvemos a capacidade de penetrar livremente no contexto do "filme incessante da vida" para ajudar os seres a reconhecer liberdades reais, ocultas pela limitação de sua experiência convencional.
Essencialmente o que fazemos é atravessar esses diferentes panoramas sem ficar cegos pelas visões que surgem. Nosso objetivo é encontrar a estabilidade e a natureza não-construída que está além das aparências. Podemos brincar com isso em uma metáfora: por maiores que sejam os incêndios e explosões nos filmes, a tela nunca queima. A tela é capaz de sustentar as maiores monstruosidades e permanecer incólume, é impossível atingi-la. Assim é nossa própria natureza básica. Conectados ao filme, temos toda a experiência de transitoriedade e nos sentimos inseguros.
No avanço deste processo de retirada de solidez das aparências internas e externas pela prática de meditação, num determinado ponto o próprio personagem que o vive acaba desaparecendo. Não há como isso não acontecer, o personagem é um processo construído e a experiência de liberdade frente a ele acaba aparecendo. Num certo ponto cessa a experiência de alguém que galga etapas ou que passa por essas experiências.
A palavra "mundo" é apenas mais uma manifestação dessa separatividade. Há um ponto onde todas as perguntas sobre deus, iluminação, espaço, tempo, somem. Quanto mais avançamos nos aspectos sutis desse processo de dissolução, menos as teorias, compreensões e cognições fazem sentido. Essas palavras estão dentro da busca de uma compreensão de "como surgiu o mundo", mas, observe, essa pergunta traz dentro de si mesma a noção de separação. É a pergunta de alguém que observa algo separado de si.
Com o progresso da prática esses elementos eventualmente desaparecem. Na linguagem dos mestres: é como uma névoa que se dissipa, ninguém sabe para onde foi; é como um eco, não há origem para aquele som, mas ele surge. Quando procuramos a origem, não há alguém que tenha produzido o som. O efeito existe, mas não há uma identidade que o produza.
A experiência das vidas anteriores, os carmas acumulados, as experiências de mundo, isso tudo é apenas uma faísca. Surgem e desaparecem. Todas as complicações também são assim. Num momento surge samsara inteiro que dura por éons, mas isso nada mais é que uma faísca atmosférica na eternidade. É como um sonho. Parece denso, pesado, mas quando a pessoa acorda, não tem nenhuma importância. Ali dentro, aquilo é vital, muito importante. É como açúcar na água, não sabemos para onde foi. É como uma frágil gota de orvalho. Também é um halo ao redor do sol - surge não se sabe de onde, e desaparece não se sabe como. Tem uma aparência, mas não tem solidez. É como um rosto visto em uma nuvem. Está lá, podemos achar auspicioso, podemos achar bonito, podemos achar parecido com o pai, com o avô. Podemos acreditar que é uma mensagem, mas é apenas um rosto numa nuvem. Também como um arco-íris - surge magicamente e se dissolve magicamente.
Quando cruzamos por esse ponto, cessa a separatividade e percebemos todas as aparências como experiências de aparências. Vemos que toda a densidade anterior existiu inseparável de nossa ingenuidade. Não é boa nem má, é ingenuidade. Quando esse ponto é cruzado, então todos os elementos se transformam. A impermanência, por exemplo, deixa de ser um infortúnio. Passa a ser evidência da liberdade. Se as coisas fossem permanentes, não haveria mudança, não haveria liberdade. A evidência da não-solidez de todas as coisas é a própria evidência de liberdades ocultas aos olhos ingênuos. Essa é a descrição do caminho Mahayana que utiliza a meditação como processo principal.

Lama Samten