sexta-feira, 17 de abril de 2009

A Claridade

Apesar da mente ser essencialmente vazia, ela não é apenas aberta ou vazia, porque se fosse, a mente seria inerte e não iria experienciar ou conhecer qualquer coisa, nem sensações, nem alegria ou sofrimento. A mente não é apenas vazia - ela possui uma segunda qualidade essencial, que é a sua capacidade de experiências, de cognição. Esta qualidade dinâmica é chamada de claridade. Ela é tanto a lucidez da inteligência da mente quanto a luminosidade destas experiências. Para melhorar nossa compreensão da claridade, podemos comparar a abertura da mente ao espaço da sala onde estamos. Este espaço sem forma permite que aconteçam nossas experiências; ele contém a experiência em sua totalidade. É onde a nossa experiência toma o seu lugar. A claridade, então, seria a luz que ilumina a sala e que nos permite reconhecer diferentes coisas. Se houvesse apenas o inerte espaço vazio, não haveria possibilidade de haver consciência. Isto é apenas um exemplo, porque a claridade da mente não é como a luz comum do sol, da lua ou da eletricidade. É a claridade da mente que faz possível toda cognição e experiência. A natureza aberta e luminosa da mente é o que chamamos de "clara luz"; é uma claridade aberta que, no nível da mente pura, está consciente em, e por si mesma; é por isso que a chamamos de cognição auto-luminosa ou claridade. Não há um exemplo verdadeiramente adequado para ilustrar esta claridade no nível puro, mas no nível comum, que podemos relatar mais facilmente, podemos ter uma idéia de alguns de seus aspectos, ao compreender uma das manifestações da mente - o estado do sonho. Vamos dizer que é uma noite escura, e que nesta escuridão estamos sonhando, ou experienciando um mundo do sonho. O espaço mental onde o sonho acontece, independente do lugar físico onde estamos, poderia ser comparado à abertura da mente, enquanto sua capacidade de experienciar, apesar da escuridão externa, corresponde à sua claridade. Esta lucidez abarca todo conhecimento da mente e é a claridade inerente nestas experiências. É também a lucidez do que ou quem as experiência; o conhecedor e o conhecido, a lucidez e a claridade, nada mais são do que duas facetas da mesma qualidade. A inteligência que experiência o sonho é a lucidez, e a claridade presente em suas experiências é a sua luminosidade; mas no nível não-dual da mente pura, é apenas uma e mesma qualidade, a "claridade", chamada de "prabhasvara" em sânscrito, ou de "selwa" em tibetano. Este exemplo pode ser útil para o entendimento, mas tenha em mente que isto é apenas uma ilustração, mostrando um nível de manifestação particular da claridade em um nível habitual. No exemplo, há uma diferença entre a lucidez o conhecedor e a luminosidade das experiências do sujeito, porque o sonho é uma experiência dualista, diferenciada em termos de sujeito e objeto, na qual a claridade se manifesta de uma vez, na consciência ou lucidez do sujeito e na luminosidade de seus objetos. De fato, o exemplo é limitado, pois fundamentalmente não há dualidade nas mentes puras: é a mesma qualidade da claridade que é essencialmente não-dual.

Kalu Rinpoche

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